(Alma)
-Mas doutor, eu estou com a menstruação. - Fora
a sua primeira reação à notícia.
-Não é muito usual uma mulher grávida ter
a menstruação mas é possível acontecer, não tem de se afligir, está tudo bem.
Aconselho-a é a marcar uma consulta de planeamento familiar para falar com um
médico mais especializado nessa área que a pode ajudar.
-Eu tenho tantas perguntas para fazer e
ao mesmo tempo só quero ficar em silêncio.
-É normal esse mar de emoções que sente,
mas tudo vai acabar por acalmar com o tempo, é uma experiência nova e as
hormonas lideram o que sente, mas o melhor é desfrutar deste momento, mais que
qualquer outra coisa. Pode fazer a sua vida normal mas cuidado com o exercício
físico, e muito cuidado com os esforços exagerados neste 3 meses é muito
importante um esforço especial, porque é uma altura delicada.
-Obrigada doutor, acho que estou
esclarecida. - Levantou-se e saiu do consultório.
Alma decidiu dar ouvidos ao médico e
tentar desfrutar daquela gravidez ao máximo, embora o bebé não fosse pensado ou
desejado era amado como se o fosse e a felicidade dominara-a por completo, não conseguia
escondê-lo de ninguém e muito menos tirar o sorriso radiante que tinha na face,
sentia-se radiante e ansiosa por partilhar com o mundo que esperava um bebé,
mas sabia que não podia nem deveria fazê-lo. Os próximos 3 meses seriam
decisivos e teria de ter muito cuidado, e apenas iria contar a poucos,
estritamente os que necessitavam de saber, como a família e os amigos mais
próximos. Sabia que eram meses críticos e tudo poderia acontecer, e além disso,
teria de ter ainda mais atenção porque Iker ainda a perseguia e ao seu namorado
e ele de forma alguma poderia saber daquele pequeno ser vivo, tinha medo do
pudesse fazer não a si, mas ao pequeno. E agora teria de contar a alguém aquela
novidade, mas quem seria a primeira pessoa a quem ela deveria contar a
novidade? Talvez à irmã, mas ela andava tão ocupada na sua “não-relação” com
José. Ou talvez à prima Catarina, mas ela
estava ocupada entre a faculdade e o seu namoro com João. Os pais também
seriam uma forte hipótese mas iriam fazer-lhe perguntas das quais ela ainda não
tinha resposta... Estava decidido!! A primeira pessoa a quem iria contar era ao
seu namorado, afinal ele era o pai, o seu namorado, ele era a pessoa no mundo
que mais merecia saber! Mas Alma queria dar-lhe a notícia de uma forma original
e decidiu logo como o iria fazer, há uns tempos tinha descoberto diferentes
formas de dar a notícia de forma original e como Shkodran gostava de beber
café, era uma excelente ideia dar-lhe a notícia no fundo de uma chávena.
Apanhou o autocarro e foi para perto da sua mais recente casa e procurou lojas
onde encontrasse a chávena ideal e acabou por descobrir rapidamente a loja e o
artigo que procurava e depois voltou para casa. Preparou um chá enquanto
esperava pelo seu namorado e quando ele chegou cumprimentou com um beijo e um
sorriso, sentaram à mesa da cozinha e ela serviu o chá.
-Porque estás tão sorridente? O que te disse o médico?
-Bebe o chá e vê o que diz no fundo da chávena.
-O que estás a preparar?
-Bebe o chá. - Shkodran obedeceu e terminou o chá num
instante.
-De verdad? - Perguntou surpreendido. - Te quiero,
te quiero, te quiero! - Levantou-se e beijou-a. Pousou a mão direita sobre
a barriga dela e deu-lhe mais um beijo, desta vez na testa. - Nem quero
acreditar!! Gracias, de corázon! - Deu-lhe mais um beijo rápido nos lábios,
era notável a felicidade e a emoção que ele sentira quando tivera a certeza que
iria ser pai. - Só me apetece contar ao mundo que vou ser pai!
-Calma. Ainda é cedo, Shkodran. -
Advertiu com os pés já mais assentes no chão. - Eu ainda só estou grávida de
6 semanas, ainda estou a meio das 12, ou
dos 3 meses, é a meio da fase crítica, acho que devíamos pelo menos esperar até
essa altura.
-A minha mãe vem cá daqui a duas semanas
e eu gostava de lhe dar a notícia pessoalmente, se puder ser.
-Claro que sim, mas só os nossos pais é
que vão saber antes das 12 semanas, vale?
-Si, cariño. -
Deu-lhe um beijo na testa. - E tenho de falar contigo sobre outra coisa mas
que envolve o nosso filho.
-Shkodran. - Alma
fechou os olhos e esperava que ele simplesmente não dissesse o que ele pensava.
-Quero que saibas que eu sou uma pessoa
que gosta de fazer tudo como deve ser feito, e também sou uma pessoa muito
crente e responsável daquilo que faço. - Hesitou. - A minha
religião diz-me que se te engravidei, temos de casar, aliás diz que depois do
casamento é que devem vir os filhos, mas nós antecipamo-nos. - Sorriu para
esconder o nervosismo. - Mas não é isso que me faz querer casar, mas o que
me faz crer casar é o facto de estarmos a começar a nossa própria família, o
facto de termos um filho e de eu ter responsabilidade sobre ti e sobre este
bebé. - Pousou mais uma vez a mão sobre a barriga dela. - Que me faz
querer casar contigo.
-Tu queres casar comigo só porque me
engravidaste? Porque a tua religião te obriga?
-Alma, eu amo-te. -
Deu-lhe as mãos mas rapidamente ela as afastou. - E eu sei que era contigo
que me iria casar, talvez daqui a uns anos ou meses, não sei, simplesmente
agora vamos fazê-lo mais rápido.
-Não Shkodran, não, simplesmente não! Eu
não quero casar-me contigo porque me engravidaste! Eu não quero passar o resto
da minha vida a pensar se estás comigo por causa dos filhos e se ainda me amas!
-Mi amor, não é nada disso. Para mim faz
todo o sentido casar-me e depois virem os filhos, é o mais certo.
-Não, não é o mais certo! O mais certo
não é de certeza eu casar-me com 18 anos e com a certeza que não estou
preparada!
-Para mim faz sentido casar-me sabes
porquê? Não posso limitar-me a ir falar com o teu pai e dizer que te engravidei
e que vamos ter um filho, não sou dessas pessoas, tu sabes que não. Se eu te
engravidei vou assumir esse compromisso e a melhor prova que posso fazer que o
faço de cabeça erguida e com responsabilidade é dizer-lhe que vamos casar, de
outra forma não teria sentido para mim.
-Mas nós somos tão novos, Shkodran. Tu
tens 23 anos e eu 18 anos, temos tanto para viver. - O
rapaz percebeu os receios que ela sentia e o medo que a assombrava.
-Eu sei que somos novos e estamos juntos
há pouco, mas também não precisamos de casar já, tens mais 7 meses e meio de
gravidez pela frente, simplesmente quero que compreendas e aceites o que te quero
dizer, e além disso quero que te cases com a tua vontade, e nunca só para me
fazer a vontade, percebes?
-Eu vou tentar perceber, juro que sim,
vou tentar perceber-te porque te amo. - Deu-lhe um beijo na ponta do nariz. -
E eu também sabia que eras muçulmano, não percebo porque é que ainda tenho
algumas reticências, eu disse-te desde o começo que te ia aceitar como és, mas
simplesmente é difícil lidar com tudo ao mesmo tempo, sabes?
-Alma, é verdade que temos crenças
diferentes e que nalgumas alturas da minha vida, vamos ser colocados à prova,
mas somos mais fortes que isto, já viste o que já passamos juntos? Estamos
juntos há dois meses e meio mas todo este tempo foi de aventuras e de sermos
colocados à prova constantemente. Primeiro, nós envolvemo-nos e tu ainda
namoravas com o Iker, depois ele começou a perseguir-nos e ameaçou-nos, depois
viemos viver juntos com semanas de namoro, e agora vivemos esta gravidez, não
achas que tudo isto foi uma enorme prova de amor? Que somos mais fortes que
tudo o que nos atravessa no nosso caminho? O nosso casamento é apenas mais uma
prova que vamos enfrentá-la juntos. - Deu-lhe um beijo na ponta do nariz.
-Eu caso-me contigo. -
Disse receosa mas com convicção. - Eu sei que somos novos, mas eu sempre me
quis casar cedo, mas é apenas uns anos antes que aquilo que pensava. E já
viste? Assim fazemos mais anos de casado, e fazemos bem mais cedo que os
outros!! - Tentou animar o ambiente. - Eu sei que te amo e que este
filho é amado como se fosse pensado e desejado, e que este casamento apesar de
repentino, nos vamos dedicar a ele de alma e coração, mas podemos esperar pelo
menos até ao meu aniversário? Queria casar-me já com 18 anos.
-Queres esperar até Janeiro? Eu até tinha
pensado casarmo-nos naqueles dias que tenho de férias entre o Natal, mas
respeito a tua decisão, casamo-nos quando quiseres e quando te sentires
preparada.
-Já me imaginaste a casar com uma enorme
barriga? Isso é uma perdição! Não pudemos é celebrar a noite de núpcias! -
Brincou com ele. - Mas vamos deixar de falar do casamento sim? É demasiadas
emoções para um dia só.
-Podemos começar a pensar no nome do
nosso filho. - Sugeriu sorrindo. - Pensei que podíamos escolher nomes
internacionais, tipo Sophia ou David, é mais justo para os dois.
-Estão escolhidos os nomes. -
Afirmou sorrindo. - Se aceitares, é claro.
-Claro que sim! -
Deu-lhe um curto beijo nos lábios. - Sophia Lopéz Mustafi agrada-me.
-Estás enganado, caro jovem alemão. Sofia
Mustafi Lopéz, nasce em Espanha, segue as normas espanholas, vale? E isso
significa que o último apelido é o da mãe.
-E se eu te pedir para ter como último
apelido o meu?
-Shkodran, eu gostava de dar continuidade
ao meu apelido.
-E eu ao meu. Porque não apostamos em
juntá-los com um hífen?
-Não, não quero isso, são dois nomes
demasiado diferentes para serem unidos com um hífen.
-Eu percebo, mas sinto que estaria a
tirar-lhe uma característica de um país que também é o dele, entendes?
-Claro que sim, mas acho que temos de
arranjar um meio termo, como fazemos sempre ou então decidimos algo e seguimos
com essa decisão para a frente. Eu acho que se nasce em Espanha, o que me
parece óbvio, então deveria ter como último apelido o meu.
-O teu poder de me dar a volta é
surpreendente, consegues sempre fazer-me ceder, é uma coisa parva!
-Simplesmente arranjo os melhores argumentos!
-E és incrivelmente sexy e fazes-me ceder por causa disso! Quero as coisas bem feitas e quero o David ou a Sophia com os teus olhos, vale?
-Simplesmente arranjo os melhores argumentos!
-E és incrivelmente sexy e fazes-me ceder por causa disso! Quero as coisas bem feitas e quero o David ou a Sophia com os teus olhos, vale?
-E a saber falar alemão melhor que a mãe!
-Este miúdo vai ser muito poliglota,
castelhano e alemão, fora o inglês, que não podia faltar e uma pitada de
italiano que o “papi” vai ensinar!
-Quem te disse que sei falar italiano?
-Estiveste em Itália e tendo em conta que
falas tão bem a minha língua ao final de tão pouco tempo, então o teu italiano
é perfeito!
-Mas tu também sabes falar italiano, paixão!
-Mas tu também sabes falar italiano, paixão!
-Não tão bem como tu, aposto.
-Mas em Espanha tive uma excelente
interprete e professora, daí ter apreendido tão rápido!
-Eu também tenho um excelente intérprete
e não é isso que me faz falar fluentemente a tua língua!
-Com o tempo vais aprender a falar bem,
até porque daqui a duas semanas a minha mãe vem cá e ela não fala castelhano...
-Isso significa que nas próximas duas
semanas, fora o tempo que a tua mãe cá estiver, vamos falar alemão, certo?
-Sim. - Sorriu. - Amor, eu
gostava muito de ensinar árabe ao nosso filho.
-Não vamos obrigar o nosso filho a seguir
religião nenhuma, sim? Ele quando for mais crescido vai tomar a decisão de
escolher entre qualquer religião, seja ela, a tua a minha, ou outra qualquer,
sim?
-Vale. - Respondeu desanimado.
-E o bebé vai ver-te rezar e vai ficar
curioso, vai perguntar, assim como vai perguntar porque rezo eu algo diferente,
e se ele quiser, vamos ensinar, mas não mais, sim? -
Fez-lhe uma pequena carícia na face. - Mas não quero incutir-lhe nada. Ele
vai decidir por ele.
-Parece-me mais justo. -
Afirmou depois de a ouvir e pensar durante alguns segundos.
-Vou-me
deitar e descansar um bocadinho, vens?
-Claro
que sim! - Deram um beijo e seguiram até à cama onde se deitaram e
enquanto Shkodran adormeceu quase instintivamente agarrando a mão de Alma, ela
não conseguia parar de pensar e sabia que não ia conseguir descansar com tudo o
que lhe remoía a cabeça. Levantou-se e foi beber um copo de leite e fez umas
torradas, sentou-se à mesa onde comeu e bebeu. Depois levantou-se e deitou-se
no sofá onde ligou a televisão e começou a tentar ver séries e entendê-las mas
na sua cabeça pairava uma única frase e toda uma linha de pensamentos. Decidiu
que talvez se pensasse em voz alta lhe ajudasse a resolver os dilemas.
-Será
que eu quero mesmo casar-me? Será que eu quero mesmo ser mãe com esta idade? Eu
tenho sonhos... Quero ir para a faculdade, quero tornar-me nutricionista e se
eu me casar e for mãe, com esta idade, o meu sonho pode nunca realizar-se. Eu
sei que o amo, mas não será demasiado cedo? E arriscado? Será que ele não podia
abdicar da religião dele pelo que é melhor para mim? Para nós? Será que eu
serei boa mãe ou será que ainda não estou preparada? E o Iker? Tenho muito medo
do que ele possa fazer, ele é doente e louco por mim, ele vai odiar mais este
bebé que odeia o Shkodran. Não era nada disto que tinha imaginado quando me
envolvi e deixei-me apaixonar por ele. - De repente começou a
ficar muito mal disposta e correu até à casa de banho onde vomitou tudo o que
comera à pouco. Será que os enjoos iriam durar toda a gravidez? Esperava que
não!! Lavou os dentes, voltou a deitar-se ao lado do seu alemão de eleição onde
adormeceu vencida pelo cansaço.
-Meu
amor? - Acordou com a voz de Shkodran e um beijo. - Preparei uma coisinha para comermos. -
Só de sentir o cheiro da comida ficou enjoada e correu até à casa de banho onde
vomitou mais uma vez. - Devia
preparar-te umas torradas porque é impossível enjoares disso.
-Vomitei
umas à pouco.
-Temos
de marcar uma consulta no médico e ver o que ele recomenda para ajudar a passar
esses enjoos, não podes passar assim toda a tua gravidez.
-Shkodran
da minha Alma. - Disse animada, depois de se limpar. - Vamos comer que este bebé precisa de se alimentar.
A rapariga fazia um esforço imenso para
comer tudo e não vomitar porque sabia que o bebé precisava de alimentos, mas
também sabia que nunca a comida a enjoara tanto na sua vida.
-Dormiste
bem?
-Que
nem um anjo. - Respondeu sorrindo.
-Shkodran,
eu tive a pensar e...
-Não.
Não me digas, por favor, que queres abortar. Eu não aguento essa dor.
-Não
é nada disso. - Respondeu acalmando-o. -
Mas e se eu não tiver preparada? E se eu não for boa mãe?
-Estás
a brincar comigo? Eu já te vi com crianças, és formidável, tens um talento
natural e elas adoram-te, vais dar uma excelente mãe... Apenas mais cedo que é
normal.
-E
se eu for boa com os filhos dos outros e não com os meus?
-Se
Deus colocou esta prova no nosso caminho é porque sabe que a iremos
ultrapassar, sim? - Colocou os dedos sobre o seu queixo e
fê-la erguer a face. - Yo te quiero mi
preciosa.
-Preciso
de estar sozinha.
-De
certeza?
-Si,
guapo. - Disse desanimada. -
Vou dar uma volta.
Shkodran queria pedir-lhe para não ir mas
em simultâneo queria deixá-la ir, queria apertá-la entre os braços e ao mesmo
tempo fazê-la sentir tudo o que a rodeava. Ele simplesmente sabia o que fazer,
pensar e sentir e ela vivia apenas todos os seus maiores dilemas e decisões, em
simultâneo, tinha de tomar uma decisão que mudava para sempre o resto da sua
vida, com apenas 17 anos.
-E
o Iker?
Alma percebeu que se havia esquecido
desse pequeno pormenor e sabia que não o podia contornar simplesmente.
-Hoje
vou estar com a minha prima, sim?
-E
vais-lhe dizer?
-Provavelmente
sim. Preciso de desabafar.
Será que Alma vai conseguir resolver os seus dilemas?
O que vai optar por fazer? E Shkodran?